terça-feira, 16 de outubro de 2012

Belo Monte segundo um guerreiro indígena

O Suspiro de um Arara guerreiro da Volta Grande do Xingu. Ele tinha um olhar permeado de uma tristeza profunda, mas tentava não aparentar. A fala mansa e um sorriso singelo pareciam apenas estar ”contando um causo”. Nas mãos as marcas que o tempo escreveu e na memória histórias não compartilhadas; que possivelmente serão enterradas quando seu dia chegar: este é Seu Leôncio, guerreiro Arara que passou sua liderança adiante e hoje assiste o fim de uma era que já não volta mais. Seu Leôncio estava ali desde o princípio na terra dos Arara da Volta Grande do Xingu. Ele viveu no tempo em que o indio podia ainda ser indio e ouviu histórias do pai que chegou a ver a Mãe das águas. Disse que ela era uma mulher tão linda que chegava a ofuscar a vista. “O Rio é vivo. A água é viva e ela movimenta. Ela movimenta igual ao ser humano. Ela dorme, ela acorda. Cada vez que ela dorme a gente tem uma oportunidade de viajar melhor porque ela silencia um pouco. Toda vida ele existiu e teve prosperidade. O Rio é moderno; ele é tudo! A água conversa, a água grita. O cara que anda na água todo dia, um dia ele vê. A mata é viva. A mata não é mal assombrada. Assim como a água tem movimento, a mata também tem. A mata é visual. A mãe do Rio é uma mulher; ela é a mãe d’água.” Sim, o Rio sempre teve prosperidade, até que Belo Monte chegou. Seu Leôncio disse que desde o aparecimento da Norte Energia tudo mudou e para pior. O alcoolismo cresceu muito entre os indígenas assim como a “fraqueza de trabalho”, pois com o rancho que a empresa começou a dar, o povo acha que dormir e comer é que é vantagem. Além disso “com a comida oferecida na Casa do Índio ninguém mais quer ficar na aldeia. A parte nossa enfraqueceu muito por causa do movimento das coisas, comida, voadeira”,lamenta ele e completa: “negócio de voadeira é bom, enquanto "nóis" tiver rio é bom, mas e depois que o rio acabar? "Nóis" vamo perde a nossa Estrada. Como é que "nóis" vamo anda quando esse rio fecha?”. Por outro lado seu Leôncio não titubeia e mantêm sua seriedade. Garante que quando tem que ir à cidade faz questão de comprar sua comida e que não come e nem bebe nada que vem da Norte Energia, assim como garante que se for chamado para ir na Norte Energia só vai se for “para matar ou morrer”. Quando pergunto o que acha da Norte Energia responde: “pra minha pessoa é só tristeza e solidão. Eu acho que não vai traze nada de bão pra "nóis". Eles falam mentira porque não tem consciência. Eles não vão dar progresso pra "nóis", eles vão dar só luz, e para fora, não pra gente.” Lhe pergunto então, o que diria às autoridades; ao presidente do BNDES, financiador da obra; ao presidente da Norte Energia; ou a Presidenta do Brasil, se ele pudesse. Ele diz: “meu amigo o seu coração é de carne ou é de pedra? Sera que você não imagina que sem a nossa estrada é o nosso fim? Com o rio seco como vamos sobreviver? O que nós vamos comer?” Ali naquela tarde, ao lado de seu Leôncio a sua tristeza se tornou a minha. A dor que vi e senti carregarei em meu peito como como quem carrega um bloco de concreto remando rio acima. Ali eu senti que contudo, fracassei. E ele, terminou o “causo” deixando ressoar no meu ouvido a palavra “meu amigo”. Apesar de tudo, ele ainda poderia se referir a estas pessoas responsáveis pela destruição de suas terras e seu povo como “meu amigo”… FONTE: Ecoreserva.com

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